A MÚSICA E A PALAVRA
César Morán: Cantautor, compositor e escritor

Está-se a reeditar a obra de Luísa Villalta, o que é uma delícia para os que conservamos as edições originais ou fomos testemunhas do seu breve e intenso decorrer vital, musical e literário, e uma fortuna para quem desconheça a sua obra e o seu génio artístico. Há pouco mais de um ano apareceu a nova edição em Galaxia do ensaio O outro lado da música, a poesía, e ao tempo víamos uma joia editorial, As palabras ingrávidas –poemas intertextuais sobre um almanaque–, último projeto poético em processo, com estudo introdutório de Armando Requeixo e desde o Centro Ramón Piñeiro, a quem a família cedeu em 2018 os fondos documentais da Luísa.
Nestes dias apresenta-se Pensar é escuro. Poesía reunida (1991-2004), volume editado e introduzido também por Armando Requeixo através de Galaxia, que integra os quatro poemários dispostos em vida por Luísa para serem publicados, desta vez reproduzindo o texto tal como a autora o deixou e/ou o lançou em cada caso, o que é de celebrar.
Luísa Villalta, que nos deixou o 6 de março de 2004 apenas com quarenta e seis anos de idade, escreveu poesia, narrativa, teatro, ensaio…, foi professora de língua e literatura, e igualmente viveu no âmbito da música, sendo violinista titulada a fazer parte da Orquestra de Santiago de Compostela, a Xove Orquestra de Galicia e outras formações de câmara, mas não só participou na chamada “música clássica”. Na metade dos 70 integrava o grupo Escaino, com Paulino M. Pereiro na frauta, seu irmão Luís M. Pereiro no clarinete e ela mesma no violino e a voz, e assim confluíamos em diversos encontros como a “Xuntanza Musical Galega da Cruña” (1977), onde participámos no Kiosko Alfonso Miguel Enríquez, José Ramón [Gayoso] e Álvaro, o grupo Cumbre, Agra (o nosso grupo de jazz-rock), Verbas Xeitosas e Jorge Fernando.
Porém, a música em Luísa está em toda a actividade criativa. É só reparar em títulos poéticos como Ruído ou Música reservada para o comprender decontado, mas são reveladores os ensaios dedicados à música e à poesia como “A língua dos sons” (revista Agália, 1986) e nomeadamente o citado O outro lado da música, a poesía, subtitulado “Relación entre ambas artes na historia da literatura galega” (A Nosa Terra, 1999). O livro, de recomendável leitura, poderia abalar entre dous pontos: o primeiro capítulo (“Este lado, a música”) e “O outro lado, a poesia”, que se prolonga até o fim, e é o que justifica o aludido subtítulo. Quer dizer que o início aborda a unidade música-poesia, disgregada depois em artes diferentes, mas sendo na prática algo unitário, mentres o resto é também uma história da poesia galega nas suas diversas fases, salientando e identificando os elementos musicais. E talvez resultem de especial interesse estético as páginas dedicadas a Manuel Antonio e a Cunqueiro, onde está o ponto álgido das vanguardas, pois a consciente irregularidade dos sons e a politonalidade levam o leitor ao conceito teórico e mais abstracto do início.
(Publicado no número 554 do semanário Sermos Galiza em Nós Diario, sábado 20-05-2023)
Outros artigos de César Morán :
César Morán: “Os esquecidos setenta”
César Morán: “Pablo e Silvio, os dous “
César Morán: “O Bombardino de Charles Anne. O músico de Cunqueiro “
César Morán: “Compopstela, de Alfonso Espiño Louro “
César Morán: “Cantar nun concerto”
César Morán: “Parroquias tour” e saúde emocional
A opinión de César Morán: “A espera de Serrat”
A opinión de César Morán: “O mais parecido ao karaoke”
A opinión de César Morán: “Anacleto músico”
Passar, verbo (in)transitivo. De Mirasol a Vinicius
FRANCO BATTIATO: popular e experimental, na busca do transcendente
Xela Arias. História de uma foto.
Na taberna cultural da Arca da Noe