L’Arche de la Défense, próximo a La Défense Arena.
UM MITO VIVENTE EM PLENITUDE
Foi-se 2024 num clima bélico e agressivo que a humanidade parece não querer evitar, mas também deixou momentos inesquecíveis de música, como a mim me tocou viver no último mês. Sem o ter projetado. o açar levou-me a Paris para assistir o cinco de dezembro ao espectacular concerto de Paul McCartney no estádio coberto La Défense Arena, duas horas e meia ante quarenta mil persoas entregadas e expectantes desde antes do início. Chegara a suspeitar que nunca veria logrado este sonho, ver um mito vivente indiscutível em pleno desenvolvimento da sua arte, e no entanto assim foi, impressões que ficam para sempre. Éramos ainda nenos quando soubemos daquele grupo de Liverpool, The Beatles, que marcaria um antes e um depois na música do século XX. No fim dos noventa assistíramos ao grandioso concerto dos Rolling Stones em Balaídos, também inesquecível. Eles têm o mérito de se manterem no passo dos anos como verdadeira banda de rock and roll. Porém, os Beatles transcenderam, foram além de Elvis, do rhythm and blues e da balada, brincando por vezes no jazz e na música “clássica” sob a mão sábia de George Martin. E aqui Paul McCartney foi essencial.
Dizia Ringo Starr numa recente entrevista que nada do feito individualmente era comparável ao construído polos quatro, e ainda lembrando algum tópico, diria-se que Ringo era a exactitude na medida, Lennon o pensador, Harrison o espiritual e orientalista, e Paul o construtor de melodias sem limite, o modulador de harmonias, o multi-instumentista… Mas são tópicos, e todo fica insuficiente.
Trás o evento do outro dia, parece-nos que Paul McCartney está a fazer quase o mesmo concerto desde há vários anos, a mesma banda com mínimas variações e algumas constantes. Começa o concerto com um tema dos inícios dos Beatles, como foi A Hard Day’s Night o dia cinco (Can’t Buy Me Love fora o dia quatro). Depois seguiram outros trinta e cinco temas, os mais deles de The Beatles, outros de Wings e mesmo um de The Quarrymen, aqueles tempos primeiros. Paul está realmente em boa forma: busca a empatia com o público tentando algumas frases em francês. Os magníficos músicos que o acompanham entram no formato de uma banda de rock marcada pola sobriedade, se não temos em conta o saxo, a trompeta e o trombão como secção de vento que enriquece o show redondo. Mas é McCartney que dá as entradas e dirige todo. A sua voz, com 82 anos, ainda brilha nos agudos e nos médios. Toca dous pianos, duas guitarras elétricas, uma acústica, o seu emblemático baixo, uma mandolina e o ukelele com que inícia Something.
Alguns instantes enardecem um público que chora com Let It Be, todo o espaço com pontos luminosos. O mais espectacular, sem dúvida, o Live and Let Die, com efeitos de luzes e fogo incendiário. Em I’ve Got a Feeling aparece John Lennon nas pantalhas, ouve-se a sua voz verdadeira e Paul dá a volta para cantar com ele. O público não resiste e irrompe em lágrimas e brados.
O espaço fica insuficiente. Haverá que escrever outro artigo.
César Morán: Cantautor, compositor e escritor
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