César Morán: ” Música em Portugal”

II EDICIÓN COCHES CLÁSICOS NO IRIXO

Theatro Circo de Braga, onde se representou o espetáculo “Quis saber quem sou”.

XUNTANZA DE CLÁSICOS NO IRIXO

A TERCEIRA MÚSICA

Vou começar polo final. Sempre o digo. Cada vez que vou a Portugal encontro a galeguidade, essências que aqui esmorecem, ainda que eles –os portugueses– não o saibam. É só passar o Minho e começar a ver que todo está bem escrito: os indicadores da estrada, os nomes de lugar, a ortografia histórica. Aqui não. Aqui temos a ortografia castelhana e essa diglossia galopante e cada vez mais patológica, como uma neurose social.


Braga está a um tiro de pedra, agora Capital Portuguesa da Cultura 2025, em ligação com a Europa e os artistas e agentes culturais bracarenses. Nós fomos em novembro, um pouco adiantados, para assistir ao concerto de Robben Ford no Grande Auditório do Forum Braga. O genial guitarrista, que em 1986 fazia parte da banda de Miles Davis inovando entre o jazz e o blues, ou já desde antes no grupo de jazz fusion Yellowjackets, ofereceu um monumental concerto com temas da sua longa trajetória, com liberdade absoluta na guitarra como uma extensão do seu corpo, todo reforçado por uma voz firme e sustentada.


Mas como viajáramos um dia antes, achegamo-nos ao histórico Theatro Circo, com toda a sua beleza arquitetónica trás a requalificação e restauro há quase vinte anos, para presenciar o magnífico espectáculo Quis saber quem sou. Um concerto teatral, dirigido por Pedro Penim que é também autor da ideia e do texto. A obra, uma produção do Teatro Nacional D. Maria II, ré-interpreta as canções da revolução 50 anos depois do 25 de Abril de 1974, e mesmo as histórias persoais dos seus artífices, na consciência de estarmos a viver tempos conflitivos e contraditórios bem diferentes. Todo o valor temático e de recuperação da memória interpretado por catorze moças e moços que em duas horas cantam e escenificam a grandíssima altura.


Admira o cuidado do som, o controlo da tecnologia que permite a transmissão do texto cantado por vozes que à vez interatuam em movimento no cenário. No entanto, aqui está o que eu chamo neste artigo “a terceira música”: como é que nós, chegados da Galiza apenas por um fim de semana, compreendemos o falar e o cantar dos atores e atrizes. Certo que o mais do tempo o texto está legendado, o qual facilita a nossa compreensão, pois no âmbito da escrita, além da ortografia, de português para galego não há nada que traduzir. Porém, nalguns momentos não há legendas, e o esforço é muito maior, porque, se no início falávamos de letras agora falamos de sons: o âmbito da oralidade, e essa é outra música, a música da pronúncia de vogais e consoantes, a entoação e o sotaque. E é que, se por um lado vivemos de costas a Portugal, por outro temos trezentos e sessenta e cinco dias ao ano de “música espanhola”. Nas vinte e quatro horas de cada dia nutrimo-nos de “música espanhola”, enquanto o galego oral vai desaparecendo na boca do castelhano que o engole cada vez mais rápido. O sotaque dos nossos pais já não é como o dos nossos avós, bisavós e tataravós, e a “música” de além Minho, que nos podia salvar, é como se não existisse.

César Morán: Cantautor, compositor e escritor

Artigo publicado o 22 de fevereiro passado no número 646 de Sermos Galiza, o suplemento dos sábados de Nós Diario.



Outros artigos de César Morán :

César Morán: ” Paul Mccartney em Paris”

César Morán: A arte que nunca foi um “hobby”

César Morán: Fausto, na memória

César Morán: A “Música de Interiores”

César Morán: A “Sexta” DE Mahler

César Morán: “O último livro de Dylan”

César Morán: “As cores do son”

César Morán: “Hannover 20-4-70”

César Morán: “Arrión”

César Moran: “Os Quadros de MussorgskY”

César Moran: “Dual Bettor”

César Moran: “Per Sant Joan”

César Moran: “Música em Luísa Villalta”

César Morán: “Roger Waters”

César Morán: “Canet Rock 75”

César Morán: “Os esquecidos setenta”

Falar de Música

César Morán: “Pablo e Silvio, os dous “

César Morán: “O Bombardino de Charles Anne. O músico de Cunqueiro “

César Morán: “Compopstela, de Alfonso Espiño Louro “

César Morán: “Cantar nun concerto”

César Morán: “Parroquias tour” e saúde emocional

A opinión de César Morán: “A espera de Serrat”

A opinión de César Morán: “O mais parecido ao karaoke”

A opinión de César Morán: “Anacleto músico”

A Música da Fala

Tanxugueiras

Música ” Comercial “

Memória do Zeca

A Beleza

O clarinete de Aquilino

A Música desde o Público

Passar, verbo (in)transitivo. De Mirasol a Vinicius

FRANCO BATTIATO: popular e experimental, na busca do transcendente

Xela Arias. História de uma foto.

Cunqueiro e os Pentagramas

A presença da música ao vivo

Na taberna cultural da Arca da Noe

A Música em estado crítico

O Idioma da Música: A Língua do canto

A minha viagem com Dámaso Alonso