César Morán: “Abril. Uma estampa de som, de cor e intimidade”

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Quando estas linhas se escrevem Claudia Abril e Marina Carpente viajam a Praga para participar no Iberian Waves 2025, representando a Galiza no Palác Akropolis o 22 de maio. Elas formam Abril, que bebe essencialmente na música tradicional, mas levando-a a outras dimensões através da sua sensibilidade e de um depurado fazer interpretativo. Participarem no Iberian Waves –um festival para achegar ao público checo a variedade musical dos países do Estado Espanhol e de Portugal– fai parte da crescente atenção que se está a prestar a Abril no seu até agora breve decurso, pouco mais de dous anos.

Pudemos vê-las ao vivo no centro Ágora da Corunha. Foi o 9 de maio na gala inaugural do Corufest 2025, conduzida pola artista Muna Duval e brilhantemente fechada por Abril num breve concerto que engaiolou o público. Até o momento conhecíamos vídeos e tínhamos delas as melhores referências, mas não ainda o prazer de as ver e ouvir em direto, assistir a um espetáculo íntimo que à vez é uma estampa de som e de cor na posta em cena sobre o palco. O duo formado por Claudia e Marina trabalha sobre melodias da música tradicional galega e ibérica, recolhidas do povo através de informantes, sobretodo da província de Pontevedra, nuns arranjos que sem estridências transcendem o netamente popular para se enlinhar em novas sonoridades que apontam à modernidade.

Abril é o mês da primavera. É o mês de Cunqueiro. Sorprende que numa entrevista na Rádio Galega, em 2024, ao ser interrogada sobre o nome “Abril”, Claudia responda: “A sonoridade gostava-nos moito (…) O primeiro concerto que demos foi tamém no mês de abril…, um mês que mostra a frescura, a primavera…”, e curiosamente Claudia não alude ao seu nome, o seu apelido, o apelido materno, e as palavras são harmónicos polisémicos que fluem como as ondas… Esses harmónicos saem da arte percutiva de Claudia –pandeireta, pandeiro–, do violino de Marina e a sua percussão camuflada, das vozes de ambas e o momento pontual em que Claudia toca o violino. Harmonia e ritmo que vai da raíz à proposta folque que num instante alouminha a música de câmara.

Elas conhecem-se desde há muito tempo, 2012 ou por aí, num campamento de música tradicional dedicada às cordas na ilha de S. Simom, começam a sua formação musical arredor da Escola Municipal de Música Folk de Vigo (ETRAD) e crescem musical e persoalmente da mão sempre. Isso comentam. Elas falam de fazer música em comunidade, a cercania do público. Se nas aldeias a música era o evento da semana, o momento de ócio e conexão com a gente, isso mesmo querem levar aos diretos, o prazer de tocar e conectar com o público. E também o baile, a fusão do baile com a música. Marina fai harmonias além das terceiras e quintas, o que nos leva à mistura de formas e à liberdade criativa. A voz de Claudia é limpa e clara, fiel nos finais ao canto de raíz, mas de repente elevada e firme remontando a tessitura. O público do Ágora também cantou, porque elas assim o pediram.

Publicado no número 660 de Sermos Galiza, o semanal de Nós Diario, sábado 31 de maio de 2025: p. 23.


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